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Bitcoins e pirâmides financeiras: como evitar cair no golpe da moeda virtual

A proliferação de moedas virtuais criou um novo buraco negro no mercado de investimentos. Poucas pessoas entendem exatamente o que são essas criptomoedas, que já chegam a quase mil versões além da mais conhecida, o bitcoin, de onde vêm e quanto valem, incerteza que é amplificada pela escala global de negociação desses ativos e sua falta de regulamentação, já que não há um governo ou instituição que se responsabilize por sua emissão ou circulação. A negociação descentralizada e sem fiscalização, por meio de sites que viram bolsas de moedas ao portador e a falta de identificação dos negociantes também abrem espaço para seu uso em mercados ilegais, justamente no momento em que as autoridades, especialmente as americanas, apertam o certo à lavagem de dinheiro no mercado formal, o que empurra parte dos criminosos para o mercado virtual.

Esses riscos não eliminam algumas vantagens para o uso das moedas virtuais, como facilitar pagamentos online ou servir de opção de moeda de troca em qualquer país ou até permitir ganhos especulativos. Só é preciso ter cuidado.

Pirâmides florescem no juro baixo

Mas um dos maiores riscos desse novo mercado são as pirâmides financeiras, que florescem quando os juros e os rendimentos das aplicações tradicionais caem, como está ocorrendo agora no Brasil. Como o mercado não é padronizado, é descentralizado e sem fiscalização, aumentam as chances de surgimento de esquemas fraudulentos que enganam os investidores, prometendo ganhos exagerados, forjando resultados e desviando recursos.

No Brasil, já ocorreram alguns problemas com sites de moedas virtuais, como Gladiacoin, que prometia retornos de 200% em 90 dias e, primeiro, parou de pagar os rendimentos, depois criou uma taxa de 15% sobre os depósitos até suspender os resgates de vez em junho deste ano. Outras, como JetCoin, Royal Dragon Traders e Cointherum, funcionavam da mesma forma, prometendo ganhos de 2% ao dia ou 200% em três meses, segundo o site Behind MLM. Há ainda os que oferecem doações desde que a pessoa doe também, o AjudaBitcoin. A pessoa doa e depois passa a receber doações de outros, sistema muito antigo de corrente que usava cartas no passado. Como se vê, nada se cria…

Boi, avestruz e bitcoin

Mas, se o mercado de criptomoedas ou moedas virtuais é novo, os esquemas de pirâmides são velhos conhecidos dos brasileiros, que já viram passar bois (Fazendas Reunidas Boi Gordo), avestruzes (Avestruz Master) e créditos telefônicos (Telexfree). Todos tinham em comum um bom argumento para explicar altas rentabilidade em mercados que pouca gente entende como funcionam. Troca-se apenas o bicho então pelo bitcoin para que a pirâmide funcione.

Efeito cunhado

O grande apelo das pirâmides é a ganância do investidor, atiçada pela promessa de ganhos elevados e a publicidade desses ganhos por pessoas conhecidas, normalmente parentes ou amigos, que estão nos níveis mais altos da pirâmide e, portanto, ainda conseguem sacar parte dos recursos. Em geral, todos reaplicam os valores sacados pois já “checaram” que o “sistema é sério”, sem perceber que em algum momento a pirâmide vai desabar.

Marketing multinível e pirâmides

Outro argumento usado para justificar as pirâmides é o marketing multinível, que é usado por empresas como Avon, AmWay, Natura e outras, e que inclui a indicação de novos vendedores. Os esquemas de pirâmide usam o mesmo sistema, incentivando os investidores a trazerem parceiros para aumentar os ganhos e receber participação. A diferença é que o foco do negócio nas pirâmides não é a venda de um produto, mas o crescimento da base de investidores.

O mercado de bitcoins e outras moedas, porém, não é em si irregular ou ilegal. Mas sua popularização abre espaço para essas pirâmides. Por isso, é fundamental saber identificar as fraudes. A coisa fica mais complicada porque os esquemas evoluíram desde o início do século XX, quando o imigrante italiano Charles Ponzi enganou Wall Street usando selos. E fica difícil diferenciar uma fraude de um sistema multinível.

Walter Salmeri, gerente de desenvolvimento de negócios da BitInka, que atua como bolsa (exchanger) de Bitcoins na América Latina, explica um pouco o funcionamento das pirâmides, o risco desses golpes e as formas para o usuário se defender. Criada em 2013, a BitInka atua em nove países: Colômbia, Espanha e Estados Unidos e com equipes locais no Chile, Peru, Argentina, Venezuela, Bolívia e mais recentemente no Brasil.

Características de uma Pirâmide

As pirâmides financeiras, ao contrário do esquema de ponzi, não possuem uma administração centralizada. Essa é uma característica que faz esse modelo de negócio ruir rapidamente. As interações entre as pessoas envolvidas no esquema de pirâmide se limitam apenas à pessoas em cargo diretamente superior ou inferior, não existindo qualquer contato com uma organização central. Uma forma fácil de identificar uma empresa que opera como esquema de pirâmide é analisando o comportamento de seus participantes. Geralmente os ganhos financeiros dos vendedores ou participantes são muito mais divulgados do que o próprio produto ou serviço prestado pela empresa.

Regra dos 70%

Nos Estados Unidos existe a famosa regra dos 70% que explica que para uma empresa de marketing multinível ser legítima pelo menos 70% do retorno financeiro deve ser sobre a venda do produto. Caso a maior parte do valor venha do ingresso de novos participantes, o usuário deve ficar atento a legitimidade do negócio. Geralmente, pirâmides financeiras aplicam uma grande quantidade da verba em marketing, e a menor parte no produto anunciado. Outra prática que diferencia as empresas de marketing multinível de pirâmides financeiras é a prática da recompra de estoques dos participantes, para evitar acúmulo, algo que não é feito nos esquemas de pirâmide.

Bitcoins não são pirâmide

Bitcoins são apenas escolhidos como uma forma de pagamento de diversos esquemas de pirâmides atuais devido a sua valorização, explica Salmeri. O funcionamento do bitcoin é como qualquer uma das criptomoedas que funciona de forma similar a qualquer outra moeda tradicional, como real ou dólar. Além de funcionar como as moedas tradicionais, o bitcoin tem vantagens em relação as moedas físicas, como a facilidade para transferências, legalidade e segurança, diz.

Ele lembra que esquemas de pirâmide e outros golpes financeiros existem desde a 1920, sempre usando as moedas tradicionais para atingir seus objetivos. “Considerar os bitcoins como um responsável pelo esquema de pirâmide é a mesma coisa que considerar as moedas tradicionais como culpadas pelos golpes financeiros”, afirma.

Muito além do bitcoin: mais de 900 moedas virtuais

Entretanto, Salmeri alerta que os usuários devem ficar atentos as moedas alternativas, conhecidas por “altcoins”. Embora existam quase mil alternativas reais, muitas pessoas negociam moedas falsas dizendo ser um ótimo investimento. Caso o usuário deseje operar com altcoins, é recomendado que ele confira o site Coin Market Cap, que lista todas as moedas verificadas, seu valor no mercado e seu histórico.

Cinco dicas para identificar um golpe

Seguindo alguns passos para verificar a validade das diferentes plataformas que podem ser usadas para comprar e vender bitcoins e outras criptomoedas, o usuário não irá ter nenhum problema com as transações e seu dinheiro estará sempre seguro, afirma Salmeri. Esses são os pontos que o usuário deve ficar atento ao negociar bitcoins e outras criptomoedas com alguém.

1) Ninguém irá te dar nada de graça. Se você receber mensagens online e propostas oferecendo dinheiro de “graça”, renda garantida ou multiplicar seus bitcoins, apenas ignore. Geralmente esses pedidos também são acompanhados de um pequeno depósito de entrada.

2) Se uma empresa oferece para você um alto lucro em curtíssimos períodos de tempo ou um retorno vitalício, certamente você será enganado.

3) Sistemas de indicações são a base do funcionamento de uma pirâmide. Se uma plataforma exige que você convide outras pessoas e que os convidados paguem para se cadastrar fique atento, elas certamente são uma pirâmide. Nunca confie em empresas que oferecem comissões sobre os valores dos participantes que entrarem com sua referência. Se você for abordado por alguém oferecendo condições similares, denuncie para o órgão responsável assim que possível!

4) Se uma empresa foca divulgar mais os lucros por indicação do que a venda do produto em si, certamente o produto não é o foco principal de vendas. Pense nisso: Se uma empresa não vende seu produto, de onde vem o lucro dela? O lucro que sustenta o topo da cadeia vem dos novos usuários entrando na base e isso se configura como um esquema de pirâmide.

5) Fique alerta com plataformas de financiamento coletivo e doações, afinal essa é uma forma comum de se justificar um golpe. Uma forma de identificar uma plataforma para golpes é se além do valor depositado a plataforma chame você e seus amigos para fazer o mesmo. Existem diversas plataformas de financiamento coletivo legítimas onde você pode contribuir com projetos de maneira segura.

Como o usuário pode se defender?

Inicialmente o usuário pode investigar o possível golpe e encontrar informações válidas em seu website. “Por exemplo na página inicial da BitInka, na parte inferior da página no canto direito você encontra o logo da BitGo, os certificados PCI 3.1 e da TrustWave,” afirma Salmeri.

Há ainda sites especializados em identificar fraudes com moedas digitais, como o BadBitcoin, que tem uma lista negra de sites irregulares. O Guia do Bitcoin também tem uma lista com sites irregulares e divulga análises de alguns portais. E, no Facebook, há o Desmascarando Pirâmides Financeiras, que também pode ajudar.

A suspeita pode começar se o site não tem endereço ou localização ou nome dos responsáveis. Não informar quem são parceiros, como bancos ou corretoras, também pode ser um sinal de alerta. Outra forma interessante para o usuário confirmar a veracidade de um negócio é questionar o possível golpista sobre o produto vendido pela empresa. Se ele não der uma resposta concreta como “cadeiras” ou ter uma descrição detalhada do funcionamento de um software ou serviço, certamente é um golpe.

Esmola demais

O usuário nunca deve acreditar em alguém que diz que pode multiplicar seu dinheiro por duas, três ou quatro vezes, seja em bitcoins ou em moedas tradicionais, afirma Salmeri. Esses resultados são impossíveis até em longo prazo e a empresa ou pessoa que está oferecendo esse serviço é uma armadilha para os participantes.

A melhor forma que um novo usuário pode se iniciar na operação com bitcoins é por meio de empresas seguras e verificadas. Para isso ele deve principalmente se informar sobre o tema, tanto por pesquisas quanto em comunidades sobre bitcoins, aconselha Salmeri.

Cuidado com os “faraós”

Outra forma de negociar bitcoins seguramente e se defender das pirâmides financeiras é ficar atento às pessoas que fazem propostas de negócio, afirma Salmeri. Os “faraós”, apelido dado aos que tentam vender os esquemas de pirâmide, tendem a conversar apenas por mensagens privadas, evitando que o esquema seja desmascarado mais rapidamente. Por fim, antes de concluir uma negociação o usuário sempre deve perguntar publicamente sobre o negócio. Assim recebendo comentários positivos ou negativos sobre o negociante, ajudando na conclusão do negócio,  afinal como diz o velho dito popular “quem não deve, não teme.”

 

 

 

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