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CVM cobra de gestores controles para cobrir saques de fundos em caso de crises

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou hoje um ofício circular, o2/2015, que cobra dos gestores e administradores de fundos de investimentos maior atenção à liquidez das carteiras para os casos de crises e aumentos de resgates. O objetivo da CVM é evitar que, em momentos de maior turbulência, os fundos fiquem sem recursos para honrar seus resgates ou tenham de vender ativos a qualquer preço para obter os recursos. A medida é voltada para os fundos abertos, nos quais os investidores podem sacar os recursos a qualquer momento, diferentemente dos fundos fechados, como os imobiliários, nos quais não há resgate.

Resgates e compromissos

 Na instrução, a CVM lembra que o gestor de um fundo deve adotar práticas, políticas e controles internos para garantir que o dinheiro disponível seja suficiente para atender aos resgates dentro dos prazos previstos para o pagamento no regulamento do fundo. Há carteiras que estabelecem por exemplo, dias, semanas ou até meses para o fundo pagar os resgates após o pedido. Outro alerta é que essa liquidez deve prever as obrigações que o fundo terá de cumprir, como depósitos de margens e outras garantias.

Concentração de investidores também pesa

As políticas de liquidez devem ainda levar em conta a facilidade com que os ativos do fundo podem ser vendidos, os valores de resgates esperados em condições normais e o grau de concentração dos investidores do fundo. Um fundo que tenha uma forte concentração em um único distribuidor, um grande private bank por exemplo, corre um risco maior de sofrer um resgate elevado caso a instituição resolva mudar de aplicação. A CVM lembra também que, apesar das normas não falarem diretamente do gestor, ele e o administrador são responsáveis por evitar problemas de o fundo ficar sem dinheiro para seus compromissos. O gestor é responsável pelos ativos do fundo, suas aplicações, e o administrador, pelo passivo, que são os investidores.

Três pontos de atenção

A CVM destacou três pontos que considera fundamentas na questão da liquidez dos fundos de investimentos.

O primeiro, é que a gestão da liquidez começa antes mesmo da constituição da carteira, no planejamento do seu público alvo, seus objetivos, estratégia e política de investimentos. Um fundo que vai aplicar em ações de empresas menos líquidas, voltado para pessoas físicas de varejo, não pode, por exemplo, ter liquidez diária, pois o gestor não conseguirá vender as ações a cada aumento de saques. Além disso, não poderá fazer uma aplicação de prazo mais longo que atenda à estratégia.

Controles de saídas

O segundo diz respeito aos controles internos dos administradores, que devem estar preparados para calcular a liquidez das carteiras dos fundos a qualquer momento, e de forma precisa. Deve ainda ser possível estimar de modo consistente as saídas previstas de caixa (que por sua vez devem considerar não apenas o pagamento dos resgates solicitados, mas também todas as despesas operacionais do fundo, bem como provisões relacionadas a operações com derivativos.

Teste de estresse com estresse de verdade

O terceiro ponto se refere aos testes de estresse, por meio dos quais os gestores simulam os piores cenários de mercado para verificar o que aconteceria com o fundo e suas aplicações. Segundo a CVM, de acordo com o artigo 65-B, §2º, da ICVM 409, esses testes não devem considerar simplesmente um horizonte histórico predefinido de atividade, mas sim simular a volatilidade que poderá ocorrer em relação à liquidez dos ativos, bem como os impactos ocasionados por resgates em períodos de crise.

Fundos novos na praça

Se o fundo for novo e não possuir um histórico que alcance período de verdadeiro estresse, uma alternativa sugerida pela CVM é utilizar como referência os impactos em termos de liquidez, tanto do ponto de vista de ativos quanto de passivos, ocorridos em fundos semelhantes nesses momentos de maior turbulência. Outra opção é simular de forma consistente condições que “representem um verdadeiro teste de compatibilidade de liquidez entre ativos e passivos”. O teste de estresse deve também considerar uma eventual concentração de cotistas, observa a CVM.

Ferramenta de simulação de estresse

A  CVM sugere aos gestores um estudo desenvolvido por ela, o Indicado de Resgate em Situações de Estresse, que traz informações detalhadas sobre uma ferramenta desenvolvida para a supervisão de fundos para acompanhar a liquidez das carteiras. O modelo está sendo utilizado na rotina de supervisão da CVM.

Na minuta, a CVM apresenta também dois exemplos de testes de estresse realizados em fundos no mercado, um com resultado positivo e outro negativo.

Bom exemplo

No primeiro, positivo, mesmo com prazo para resgate no mesmo dia, o chamado D+zero, o índice de liquidez em cenário de estresse (definido como ativos líquidos estressados divididos pelo patrimônio líquido do fundo) da carteira ficou em 8,7094%, superior ao pior resgate desde 2008, que teve um índice de liquidez de -7,0138%. “Ou seja, o administrador consegue demonstrar que em um cenário de estresse de liquidez tanto de ativos quanto de passivos a situação do fundo é aderente ao disposto no art. 65-B da Instrução CVM nº 409/04”, diz a CVM, que acrescenta que, em situação de normalidade, o índice de liquidez desse fundo seria 3,8 vezes maior que o exigido.

Mau exemplo

Já o mau exemplo seria de um fundo no qual o índice de liquidez ficou perto de 4% do seu patrimônio líquido e o maior resgate ocorrido nos últimos 12 meses corresponde a 2,73% do patrimônio líquido. Pelas características apresentadas, o administrador considera que o fundo não apresenta riscos de liquidez. “Nesse caso, consideramos que a utilização de um histórico de 12 meses, sem que o teste alcance um período que cubra realmente uma situação de estresse para ativos e passivos do fundo, não é aderente ao disposto no art. 65-B, § 2º, da ICVM 409”, diz a CVM. Ou seja, o fundo não testou uma situação de turbulência e não cumpre as normas de segurança de liquidez.

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