Arena Especial, Política Econômica

Após rombo recorde em setembro, meta fiscal de 2014 deve ser reduzida

Faltando os resultados de apenas três meses para o fechamento das contas públicas deste ano, é virtualmente impossível que o governo consiga cumprir a meta de superávit primário, de R$ 99 bilhões ou 1,90% do PIB, avaliam economistas e analistas de bancos. A meta considera os resultados do setor público consolidado, que inclui o governo central (Tesouro, Banco Central e Previdência), Estados, municípios e estatais. As estimativas são de que o resultado fique entre zero e 0,5% do PIB.

Os números de setembro do governo surpreenderam negativamente até os mais pessimistas e o saldo acumulado no ano ficou negativo pela primeira vez desde o início da série histórica, em 1997, quando o governo criou o critério de superávit primário, que inclui apenas receitas menos despesas, sem contar os juros da dívida. O resultado primário representa a economia que o governo faz para reduzir a dívida pública.

Gastos maiores para manter crescimento

O Itaú Unibanco destaca que, no ano, a despesa do governo cresceu 5,3%, puxada pelo investimento, que aumentou 25,7%, e por outras despesas de custeio, que subiram 9,1%. Um sinal do esforço do governo em gastar mais para tentar manter a economia aquecida. “A expansão da despesa acima do ritmo de crescimento potencial da economia evidencia a postura fiscal expansionista do lado da despesa”, afirma o banco.

Impacto nas agências de rating

A expectativa agora é que o governo reveja a meta e a reduza para menos de 1% do PIB. Os números de hoje devem ter impacto muito ruim para os mercados locais e internacionais e para as agências de classificação de risco, que ameaçam rebaixar a nota de crédito brasileira no ano que vem, o que pode pressionar ainda mais os juros e o dólar.

Recorde negativo

O déficit primário do setor público brasileiro, que reúne as receitas menos despesas do governo federal, estados e municípios e estatais, de R$ 25,5 bilhões em setembro, ficou muito acima do projetado pelo mercado, que trabalhava com R$ 16 bilhões negativos. Além de ser o maior desde 2001, o resultado zerou o ganho acumulado no ano e tornou o saldo negativo em R$ 15,286 bilhões. O déficit acumulado de janeiro a setembro equivale a 0,42% do PIB  no período, e é o primeiro saldo negativo no ano em setembro da série histórica.

Acumulado de 0,61% do PIB em 12 meses

No acumulado em 12 meses, o resultado primário do setor público ainda é positivo em R$ 31 bilhões, mas o saldo equivale a 0,61% do PIB, bem abaixo da meta de R$ 99 bilhões, ou 1,90% do PIB. Até agosto, o superávit era de R$ 47,5 bilhões, ou 0,94% do PIB. “A situação das contas públicas é bastante delicada”, afirma o Banco Fator, em relatório assinado pelos economistas José Francisco de Lima Gonçalves e Júlia Araújo. Com apenas mais três meses para completar o ano, o banco acredita que “o cumprimento da meta é virtualmente impossível”.

Muito pior que o esperado

O maior responsável pelo déficit do setor público foi o governo central, formado por Tesouro, Banco Central e Previdência, que fechou setembro com um saldo negativo de R$ 20,995 bilhões, o pior desde 1997 e bem acima das estimativas mais pessimistas do mercado, que variavam de R$ 12 bilhões a R$ 15 bilhões. Com isso, o resultado do governo central acumulado em 12 meses caiu de 0,78% do PIB para 0,57%, longe da meta, de 1,55% do PIB. Estados e municípios e estatais contribuiriam com o 0,35 ponto restante para o cumprimento da meta do setor público geral, de 1,90% do PIB.

Mais gasto, menos receita

Segundo a MCM, os números de setembro do governo central vieram ruins tanto do lado da receita quanto nas despesas. As receitas caíram 0,17% em setembro, reduzindo o crescimento no ano para 0,16% em relação ao mesmo período do ano passado.

Receitas extraordinárias ajudam

O problema é que a projeção era de um crescimento real de 2,8% das receitas em 2014. A MCM observa ainda que o número poderia ser pior. Sem contar as receitas extraordinárias, como o refinanciamento de impostos pelo Refis, a arrecadação teria caído 1% no ano. O esfriamento da economia e as desonerações seguem pesando sobre a arrecadação, diz a consultoria.

Despesa cresceu 6,54%, sem precatórios

Já do lado das despesas, de R$ 98,1 bilhões em setembro, a surpresa ficou com os gastos com pessoal e encargos, benefícios previdenciários e custeio e capital. O item custeio e capital veio com uma despesa extra de R$ 2,5 bilhões como “outras despesas”. Com isso, no acumulado do ano, as despesas cresceram 6,54%, ante uma previsão de 3,5% do governo para todo o ano de 2014.

A MCM observa ainda que, se for descontada da base de comparação do ano passado o pagamento de precatórios devidos pelo governo, que este ano só serão pagos em novembro, as despesas do governo central teriam subido 7,45%. Grande parte desse crescimento se deu no item despesas discricionárias, aquelas que o governo tem a opção de fazer ou não, e que aumentaram 10,1%.

Revisão da meta

Para a MCM, o resultado emite um “sinal muito ruim” para o mercado e para as agências, sobre “a disposição do governo de cumprir com um ajuste fiscal”. A consultoria considera a situação “dramática” e trabalha com um superávit primário de 0,5% do PIB neste ano, contando com Refis, Fundo Soberano, pagamentos da Petrobras e leilão de telefonia 4G. A expectativa da MCM é que ameta seja revista pelo governo na programação orçamentária de novembro.

Superávit perto de zero em 2014

Para a MB Associados, o superávit do setor público consolidado de apenas 0,6% do PIB em 12 meses não apenas é o pior em 12 anos, como também não parece haver tendência de melhora. A consultoria lembra que, no fim do ano passado, houve uma entrada inesperada de recursos do Refis que dificilmente vai se repetir agora. Além disso, o leilão do campo de petróleo de Libra sairá do saldo acumulado em 12 meses. “No final, é provável que o governo entregue um primário em torno de 0% do PIB no fim do ano”, diz a consultoria.

Sem efeitos especiais, déficit de 0,2% do PIB

Depois dos números de setembro, o Itaú Unibanco reviu a projeção de superávit primário do setor público de 0,9% do PIB para 0,5%. Considerando apenas receitas e despesas recorrentes, sem eventos especiais como Refis ou leilões ou adiamentos de pagamentos, o banco estima que o governo fecharia o ano com déficit de 0,2% do PIB. Isso contando com uma desaceleração nas despesas discricionárias até o fim o ano, alguma recuperação na arrecadação e cerca de R$ 20 bilhões em receitas não recorrentes.

Dívida pública em alta

Para o Itaú, sem eventos especiais, apenas com receitas e despesas recorrentes, o resultado primário do governo central seria negativo em 0,5% do PIB. O banco destaca ainda que a dívida bruta do governo geral subiu de 60,1% do PIB em agosto para 61,7% em setembro. E acredita que a dívida líquida, estável em relação ao PIB em 35,9%, deve crescer daqui para frente por conta do baixo nível do superávit primário.

 

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