Arena Especial, Política Econômica

Após impeachment, Temer terá de mostrar a que veio, avalia Rio Bravo

A bolsa brasileira perdeu a força nas últimas semanas, refletindo um pouco da decepção do mercado com o governo interino e suas primeiras derrotas no Congresso, um movimento típico de ressaca depois da euforia dos investidores e analistas. Nada de sério, porém, aconteceu para justificar essa mudança de humor, explica Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo Investimentos. Mas, acabando o processo de impeachment nesta semana, o governo de Michel Temer vai ter de mostrar a que veio. Até agora, o mercado se contentou com a indicação de uma equipe econômica excelente, mas vai ser preciso avançar nas reformas, alerta o economista.

O pior cenário para o país, de queda de mais de 4% do PIB neste ano, estagnação no ano que vem e incertezas, porém, já passou, avalia Buccini, e agora o que se discute é de quanto pode ser a recuperação. O problema é justamente conter o otimismo exagerado. “Tem muita coisa para fazer antes de o país retomar o crescimento, o que deve demorar”, diz.

A Rio Bravo espera que o governo consiga aprovar o teto dos gastos públicos no Congresso, uma novidade muito boa e que parece que vai fazer a diferença no longo prazo. O projeto casa com a reforma da Previdência, uma medida que o economista não esperava em governo interino. “Estamos discutindo parâmetros, e não se vamos fazer uma reforma”, destaca. Há também a reforma trabalhista, que também teria efeitos benéficos nas expectativas. O grande número de projetos impopulares, porém, preocupa um pouco Buccini. “Não se pode sobrecarregar o Congresso, já que muita coisa é emenda constitucional e mexe com direitos e benefícios”, diz.

A vantagem do novo governo seria a base grande e a oposição enfraquecida. Não que os políticos tenham mudado, observa Buccini, lembrando que o PMDB ainda é o mesmo partido de sempre. “Mas, dado o que aconteceu no passado recente, cassar uma presidente por problemas fiscais e por descontrole da dívida pública, fazer política fiscal organizada passa a ser visto daqui em diante como o certo a fazer”, afirma. “Há incentivos para fazer isso, pressões da população, e o PMDB deve reagir a esses incentivos”, acredita.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, também tem interesse  que as reformas deem certo, até pelas suas ambições políticas. “Ele tem sonho de ser presidente e, se fizer a correção de rumo bem feita, pode conseguir”, afirma Buccini, lembrando o caso de Fernando Henrique Cardoso que, como ministro da Fazenda de Itamar Franco, organizou e implantou o Plano Real.

O grande desafio atual é que, diferentemente de 1994 e do Real, o ajuste fiscal mexe com grande parte da população e será preciso convencer as pessoas e a base de Temer de que ele é bom para todos. A briga recente entre PSDB e o PMDB em torno do reajuste do funcionalismo público é um exemplo. Mas, para Buccini, os tucanos estão mais tentando marcar uma posição a favor do ajuste fiscal, enquanto o PMDB tenta conter os lobbies dos funcionários que atrapalhariam as votações. “Um sinal bom vai ser ver a convicção com que o PMDB vai votar esse ajuste fiscal”, afirma.

Ajuda o cenário político o fato de o PSDB não ter nenhum nome forte para disputar a Presidência em 2018, além dos três de sempre, Aécio Neves, José Serra e Geraldo Alckmin, nenhum deles com grande favoritismo. Com isso, a oposição a Meirelles pode ser um pouco menos radical.

Crescer pouco

O economista afirma que a economia está melhorando, como mostram os números de confiança do consumidor e da indústria, que estão subindo mais rapidamente que o esperado. Com isso, a Rio Bravo melhorou a projeção para a queda do PIB neste ano, de -3,8% para -3,2%, já com algum crescimento no quarto trimestre deste ano. E, em 2017, já deve haver algum crescimento, de 1%, percentual que deve se manter nos próximos anos. “Para crescer 1% ou 1 e pouco, não precisamos de muita coisa, mas para voltar a 3%, 4% ao ano, aí teríamos de receber uma boa ajuda externa ou uma reforma fiscal como nunca foi feita neste país, difícil para qualquer governo”, diz. Como a Rio Bravo não acredita em milagres do exterior ou do lado fiscal, a expectativa é de crescimento baixo por muitos anos.

Um dos fatores que impede um crescimento maior é o juro básico, que deve continuar alto neste ano e só cair em novembro. Já no ano que vem, a taxa pode terminar em 11,25% ao ano, mas isso vai depender da inflação. Se ela surpreender para baixo, pode permitir uma queda maior da Selic. O dólar deve ficar perto de onde está, o que vai ajudar a segurar a inflação. Mas Buccini acredita que será difícil o IPCA convergir para os 4,5% da meta já no ano que vem, como quer o BC.

BC menos rigoroso

O mais provável, diz, é que o governo “flexibilize” o discurso de cumprir a meta já em 2017. “O novo BC precisava mostrar firmeza, já que a inflação não ficava na meta desde 2008, e fez isso, tanto que o mercado adiou a projeção de queda nos juros, esperada já para agosto deste ano”, observa o economista. No ano que vem, com a confiança reconquistada, o BC pode soltar um pouco a mão e indicar que a convergência para a meta pode levar um pouco mais de tempo.

Já para a bolsa, o economista acha que os fatores macroeconômicos devem influenciar positivamente o mercado. “Não sei se está nos preços o fato de o país sair da recessão e voltar a crescer, mesmo que pouco, mas de forma sustentável”, diz. Além desse fator positivo, há o fluxo de estrangeiros para o Brasil, que deve ser expressivo após o impeachment, por conta dos juros negativos na maior parte do mundo.

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