Ações na Arena, Oferta pública

Controle de ofertas de empresas via internet será feito pelas plataformas, explica CVM

A proposta de regulamentação das ofertas de investimento em pequenas empresas via internet divulgada hoje prevê que as plataformas de equity crowdfunding terão um papel fundamental no controle das operações, explica Antônio Carlos Berwanger, superintendente de desenvolvimento de mercado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Por isso, a proposta, que entrou hoje em audiência pública, impõe a essas plataformas de distribuição uma série de condutas, vedações e obrigações de verificar o cumprimento dos requisitos pela empresas e o perfil dos investidores, afirma. “A norma reconhece a plataforma com um grande ‘gate keeper’ (guardião), que vai garantir que a oferta está correta”, acrescenta.

Investindo com os bons

As regras de captação via internet para empresas ficarão em audiência pública, recebendo sugestões, até 6 de novembro. Mas Berwanger destaca que os tópicos foram bem discutidos com o mercado e os pontos de discordância foram mapeados. A proposta de regulamentação era esperada desde o fim do ano passado, mas a CVM resolveu esperar para torna-la mais completa e atual, diz o superintendente. “Inovamos em relação a outras regulamentações internacionais ao permitir a criação de sindicatos de investimento participativo, veículos patrocinados por investidores mais experientes, os investidores anjos, para participar nas start ups”, afirma Berwanger. Ele diz que, lá fora, esses investimentos são feitos por plataformas não registradas destinadas a investidores qualificados. No Brasil, elas já surgirão dentro da norma, como coofertantes.

Pela regulamentação, um investidor especializado, ou investidor anjo, poderá criar uma sociedade de propósito específico (SPE) para investir em determinada empresa iniciante. A SPE vai comprar os títulos da empresa e, por sua vez, emitirá um título espelho que será vendido para outro investidor menos experiente. “Assim, em vez do empreendedor ter várias pessoas investindo direto, ele tem teria um veículo que consolidará todos os investidores em um só sob a liderança desse investidor anjo, que representará os demais”, afirma Berwanger. Em troca, esse líder terá uma porcentagem do ganho se o investimento der certo.

Mentores de novatos

Para liderar esses grupos, porém, o investidor anjo também terá de cumprir uma série de exigências e colocará sua reputação em jogo, indicando quais são bons negócios em empresas stat ups. Esses profissionais são procurados pela experiência nesses negócios e muitas vezes se tornam mentores dos empresários novatos, ajudando também na rede de relacionamentos da empresa recém-criada e em sua administração. Segundo o superintendente da CVM, uma plataforma brasileira já estava migrando para esse modelo de investimento com consultor e por isso o regulador resolveu já colocar a figura nas normas.

A prova dos sete anos

Quem quiser ser coofertante, porém, terá de cumprir uma série de exigências, como descrever as funções que terá na nova empresa. Precisará também investir no mínimo o equivalente a 5% da oferta, para participar também dos lucros ou perdas do projeto. “Não é só dar indicação e receber a taxa de sucesso”, explica Berwanger. Será preciso também ter feito sete investimentos nos últimos sete anos e deixar na plataforma de distribuição os dados desses investimentos e suas referências, seu perfil e os motivos porque está recomendando aquele investimento. Já a plataforma será responsável por montar a SPE para captar os recursos e emitir os títulos-espelho e terá também de acompanhar o investidor anjo. “O investidor poderá assim escolher entre investir diretamente ou por meio do especialista”, diz.

Empresas maiores poderão usar

Segundo Berwanger, a norma de crowdfunding tem três pilares. O primeiro é a dispensa de registro da oferta pública e da empresa emissora, como ocorre hoje na Instrução 400, mas que passará a ser mais ampla. Hoje, apenas micro e pequenas empresas, com faturamento até R$ 3,6 milhões por ano, podem usar a dispensa para crowdfunding. Pela nova legislação, o limite passa a ser a receita bruta anual, de até R$ 10 milhões por ano, e não há mais distinção entre empresas limitadas ou sociedades anônimas.

Captações aumentarão para R$ 5 milhões

Outra alteração é que as ofertas poderão chegar a R$ 5 milhões por ano, mais que o dobro do limite atual, de R$ 2,4 milhões. E os limites para o investimento de varejo, de R$ 10 mil por ano, poderão ser ampliados para 10% da renda ou do patrimônio para investimento dos interessados. “Dessa forma, mantemos a possibilidade de prejuízos do pequeno investidor limitada a 10% do patrimônio ou da renda”, explica.

Plataformas serão reguladas pela CVM

O segundo pilar é a definição dos parâmetros de atuação das plataformas de equity crowdfunding e seu reconhecimento como participantes do sistema de distribuição de valores mobiliários brasileiro. As plataformas passarão a ser registradas na CVM para conduzir esse tipo de oferta e terão de seguir uma série de condutas, vedações e obrigações de verificar o cumprimento dos requisitos exigidos pelo regulador.

Muita informação para o investidor

Já o terceiro pilar diz respeito à clareza das informações aos investidores. O regime informacional, como chama a CVM, começará na oferta de papéis, com um conjunto de informações essenciais e anexos, que serão padronizados para garantir que os investidores receberão as informações básicas sobre a operação, como valor, riscos, tipo de oferta, de papel, forma de conversão, projeto, etc. Com a leitura dessas informações, diz Berwanger, o investidor vai estar preparado para tomar a decisão.

Em um segundo momento, depois da oferta, há informações periódicas que as empresas terão de prestar para os investidores. A CVM não vai definir quais serão essas informações, mas o empreendedor vai ter de se comprometer no momento da oferta a transmitir periodicamente alguns dados. “Achamos que não caberia a nós estabelecer como na Instrução 400, das empresas abertas, quais informações a empresa precisa dar, pois como são negócios emergentes, pode ser mais importante ter dados de pessoas que tiveram acesso a determinado aplicativo do que o faturamento”, explica.

O terceiro requisito informacional é da plataforma para a CVM. Elas terão de repassar para o regulador os dados de todas as ofertas que fizer durante o ano, tanto as que deram certo quanto as que não deram, o número de empreendedores, de investidores que participaram, etc.

CVM quer que os riscos fique claros

A CVM deu ênfase também à questão do risco para o investidor. Por isso, há necessidade de assinatura de um termo de ciência de risco por parte de quem vai participar das ofertas de equity crowdfunding, deixando claro as possibilidades e perdas relacionadas a liquidez baixa do negócio ou mesmo fracasso do projeto, e que o emissor não é registrado na CVM ou que não há informações contínuas. Há também uma série de alertas para apontar o risco relacionado à oferta. As plataformas terão ainda de desenvolver um matéria didático que explica o funcionamento das operações e seus riscos. “Selecionamos informações que destacam bastante o risco da oferta e do investimento”, afirma Berwanger.

Capital mínimo de R$ 100 mil para plataformas

A CVM definiu também que as plataformas precisarão ter um capital mínimo de R$ 100  mil para funcionar. “Queremos garantir que as plataformas terão estrutura mínima para cumprir os requisitos da regulação e achamos que esse valor é o mínimo para garantir pessoal, estrutura, não queremos uma pessoa que acorde um dia e resolva fazer ofertas de equity crowdfunding”, diz.

Tipo de papel e participação no capital

A regulação deixará também a critério das empresas o tipo de papel que oferecerão aos investidores e a definição da participação do capital em caso de abertura no futuro. Assim, as pessoas investirão em títulos de dívida da empresa conversíveis que vão representar uma porcentagem fixa do capital desde o início, ou não. “Não fechamos a possibilidade de a precificação ser feita no momento da conversão pelos resultados da empresa”, explica Berwanger. “Mas, se for esse o caso, a empresa vai ter de definir quais critérios usará para  transformar aquele título de dívida em participação”, acrescenta.

Ele diz que, nos EUA, o modelo mais usado, de dívida conversível, é facilitado porque as empresas já nascem como sociedades abertas, com ações. No Brasil, porém, pela complexidade da lei e pelas vantagens fiscais, a maioria das pequenas empresas tem capital fechado e são limitadas.

Em muitos casos também tanto o investidor quanto tomador não querem se amarrar a um percentual do capital, pois não sabem como aquela inovação vai ser recebida pelo mercado. “É mais prudente ter alguns critérios para precificar e usar esses critérios no momento da conversão, e não estabelecer no momento zero”, diz.

 

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