Arenas das Empresas, Notícias do dia

Giannetti: eleição de 2018 será fundamental para continuidade da Lava Jato; polarização é risco

As eleições de 2018 serão fundamentais para a continuidade da Operação Lava Jato e das mudanças no Estado brasileiro para reduzir a corrupção e o distanciamento da sociedade. A avaliação é de Eduardo Giannetti da Fonseca, economista e cientista político. Ele teme que, se a eleição não trouxer uma solução para esses problemas de representatividade e corrupção, ocorra uma onda de manifestações populares, como os episódios dos protestos de 2013 que se espalharam por todo o país. Ele participou do 8º Congresso Internacional dos Mercados Financeiro e de Capitais, em Campos do Jordão.

Ele trabalha com dois cenários para a eleição presidencial de 2018, polarização e pulverização. A variável crítica para definir qual desses cenários prevalecerá é presença ou não de Luiz Inácio Lula da Silva como candidato. Se isso ocorrer, será quase inevitável uma polarização da campanha, entre Lula e os anti-Lula. “Mas aí há uma questão jurídica, e se país tiver um mínimo de bom-senso e respeito à democracia, precisamos saber o mais rápido possível se Lula está ou não habilitado”, diz. Para ele, a decisão sobre o recurso do ex-presidente no Tribunal Regional Federal (TRF) tem de vir logo, até para evitar judicialização da eleição.

Um cenário de polarização deve favorecer alguns candidatos como João Dória Junior, prefeito de São Paulo pelo PSDB, e Jair Bolsonaro, do PSC, os mais identificados como anti-Lula.

Se Lula não for candidato, o cenário é de pulverização, com muitos candidatos que não estão no radar se animando. Algo parecido com campanha de 1989, quando concorreram Ulisses Guimarães, Aureliano Chaves, Ronaldo Caiado. “Deve ocorrer uma grande dispersão e a definição só virá nos meses finais de quem chegará ao segundo turno”, avalia Gianetti. A pulverização é melhor para o debate político e para o país, avalia. “Já a polarização leva campanha como luta do bem contra o mal, fla-flu de oposições incapazes de diálogo, e torço para isso não aconteça.”

Sem reforma política, Lava Jato não adianta

A Operação Lava Jato é o fato mais importante da história do país nos últimos anos, avalia Giannetti. Mas, muito mais que a investigação de corrupção, é um retrato da deformação patrimonialista do Estado brasileiro. “Mas ela não é suficiente, pois se regras políticas não mudarem, o sistema continuará o mesmo”, alerta.

O patrimonialismo brasileiro começou com a própria colonização do país, com a doação das sesmarias para os amigos do rei de Portugal, ou seja, já com as benesses do Estado, lembra Giannett. Uma situação diferente dos Estados Unidos, onde o Estado foi invenção da sociedade. “O problema no Brasil é que a inversão de origem do Estado não foi alterada, governantes e patronato político acham que sociedade existe para servi-los”, explica Giannetti. “A Lava Jato foi uma aula de sociologia política como nunca tivemos”, diz.

Segundo o economista, a Lava Jato escancarou a deformação da relação entre o Estado patrimonialista e a sociedade. E mostrou como o setor privado busca atalhos no balcão de negócios do governo para crescer com as benesses do Estado, que recebe em troca recursos para se perpetuar no poder. “O poder se torna um fim em si mesmo e nossa economia de mercado uma caricatura, pois a empresa cresce, mas não por agregar valor, criar valor socialmente reconhecidos, e os negócios que crescem são a Odebrech, a J&F, porque colocaram o Estado brasileiro em sua folha de pagamento”, afirma Giannetti. “E encontraram governantes dispostos a fazer esse jogo.”

Ele observa que a deformacao patrimonialista do Brasil cresceu especialmente nos governos do general Ernesto Geisel e no de Dilma Roussef. No de Dilma, esse patrimonialismo se associou a um projeto de perpetuação de poder, com um “balcão de negócios aberto para crescimento totalmente espúrio”.

Lava Jato não é suficiente

Para Giannetti, a Operação Lava Jato não é suficiente. “Apurar e punir só não resolve, por mais bem-vindas que essas punições sejam, não sairemos do jogo se não recuperarmos as instituições da democracia”, alerta. É preciso avançar em duas frentes, reforma política, como caminho de resgate de democracia funcional, e o amadurecimento na consciência brasileira.

Segundo o economista, houve uma deterioração do chamado presidencialismo de coalizão. O Executivo não conta com base de sustentação no Congresso calcada em programas, há uma enorme fragmentação partidária, com 28  partidos criados pelo incentivo errado para a fundação de legendas apenas para negociar o horário político e receber parte do fundo partidário.

Fim do presidencialismo de coalizão

Ele cita o primeiro governo Lula como um “momento belo da nossa democracia”, de acordo supranacional para manter a política econômica durante uma transição complicada de poder. Antes, diz Giannetti, Fernando Henrique Cardoso perdeu a base para garantir reeleição. “E se aliou às forças espúrias do Congresso, basta lembra que Renan Calheiros foi escolhido para ministro”, lembra. Lula teve momento de inflexão com o  mensalão. “No momento em que ele viu a sobrevivência política ameaçada, ele se aliou ao que há mais sinistro da política brasileira, como Collor, Sarney”, disse.

Já a ex-presidente Dilma foi uma “aceleradora de crises” e levou presidencialismo de coalizão a um estado terminal. “No segundo mandato, ela começa loteando 39 ministérios, entre 10 partidos, em nome de uma base de sustentação no Congresso, e não conseguiu eleger o presidente da Câmara”, lembra Giannett. “Faliu o presidencialismo de coalizão, e o governo nasceu morto e o impeachment foi consequência.”

Giannetti acredita que, para recuperar a relação construtiva entre Executivo e Legislativo, é preciso no máximo 4 partidos que representem sociedade. “Não pode ser relação de parasita e hospedeiro como hoje”, diz. A relação entre Executivo e Legislativo não pode ser baseado em verbas, benesses, favorecimento, mas acordos programáticos.

Já na economia, a grande reforma é uma clara separação entre publico e privado, diz Giannett. “O Estado está onde não deveria e não está onde deveria”, afirma. Ao proteger setores, dar crédito subsidiado, dar contratos com acesso ao poder, o Estado distorce a economia. E é preciso respeito às regras de mercado, não há nada errado na corrida pela competição.

O Estado, diz Giannetti, deveria estar na formação de capital humano, ensino de qualidade, saúde pública e saneamento básico. “Praticamente metade dos municípios não tem tratamento de esgoto.”

Giannetti diz que está confiante que o Brasil sairá desse processo doloroso de autoconhecimento melhor do que entrou. “Por mais doloroso, é melhor saber do que não saber, o pior dos mundos é tudo isso existir e não sabermos, com a dúvida sobre até onde isso chega”, diz. “O que aconteceu agora foi escancaramento da deformação patrimonialista em que a corrupção é um dos elementos, mas as eleições de 2018 serão chamamento para que sociedade se pronuncie em relação a tudo que apareceu”.

 

Artigo AnteriorPróximo Artigo