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Fundos de pensão têm déficit de R$ 65 bi em 2015 até novembro; solvência cai para 90%

Os fundos de pensão apresentaram um déficit de R$ 64,9 bilhões nos primeiros 11 meses de 2015, conforme dados divulgados hoje pela Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp). O déficit mais que dobrou em relação aos R$ 31,4 bilhões de 2014, com um crescimento de 106,68%, mas já vinha aumentando desde 2012 e a expectativa é que chegue a R$ 70 bilhões ou um pouco mais no fechamento de 2015, diz o presidente da Abrapp, José Ribeiro Pena Neto.

Metade das entidades com déficit

Já os fundos com superávit acumulam R$ 13 bilhões até novembro e devem fechar o ano com R$ 10 bilhões, afirma Pena Neto. “Muitos fundos que eram superavitários passaram a ter déficit no ano passado”, diz. No total, 108 entidades tiveram déficit até novembro e 115, superávit, de um total de 307, afirma Pena Neto.

Apesar de o número de entidades com déficit ser quase igual à das com  superávit, o déficit é muito maior porque grandes instituições estão entre as que não conseguiram cumprir as metas atuariais.  Entre elas, estão grandes fundos de estatais, que são também os maiores do mercado. “Logicamente, quando você tem grandes fundos com déficit, o valor do déficit é muito maior”, diz.

Ajuste aumentou passivos

Segundo Pena Neto, os fundos têm obtido rentabilidade acima da meta atuarial. Mas as despesas cresceram mais nos últimos anos, principalmente por maior prudência dos fundos, que passaram a incorporar em seus passivos algumas hipóteses que fizeram o débito potencial crescer. Foi o caso do aumento da longevidade que, apesar de positiva para as pessoas, aumenta os passivos dos fundos de pensão. Os fundos reduziram também as taxas de desconto usadas para trazer a valor presente os compromissos, o que fez crescer esses passivos. Houve também um aumento de demandas judiciais nos grandes fundos de pensão por vantagens antes não incluídas que tiveram de ser pagas.

Aplicações renderam menos

Ja do lado dos ativos, houve período muito ruim para a bolsa que prejudicou a parcela em ações dos fundos de pensão. Houve também maior diversificação na economia real após a queda temporária do juro em 2010 e 2011, e alguns investimentos ainda não tiveram a performance esperada. “Foram feitas aplicações em fundos de participação em empresas (FIP) que vão ter bom desempenho quando a economia voltar a crescer, mas por enquanto prejudicam a carteira”, explica Pena Neto.

Do lado da renda fixa, houve o impacto da alta dos juros nos últimos anos, especialmente em 2015, e quando aumentam as taxas de juros de longo prazo, carteiras de renda fixa têm de ajustar os preços de seus títulos aos valores de mercado e perdem valor. “Não há impacto no fluxo de caixa, os títulos que pagavam 3,9% ao ano mais IPCA continuam rendendo a mesma coisa, mas muda o balanço, ou seja, muda a foto, não o filme”, diz.

Renda fixa deve chegar a 70% da carteira

Essas mudanças no mercado têm levado os fundos a ajustar seus ativos à realidade, sofrendo com as turbulências, afirma Pena Neto. Dos R$ 698 bilhões em investimentos dos fundos de pensão fechados, 69% estavam em ativos de renda fixa em novembro do ano passado, sendo 49% títulos públicos e apenas 20% em ações. Como comparação, a parcela de renda fixa dos fundos era de 64% em 2014. “Houve uma migração ainda maior para títulos públicos mais recentemente, nos últimos meses, e que deve continuar neste ano, com um aumento da parcela de renda fixa”, afirma Pena Neto. “O movimento em direção à tomada de risco mudou para mais conservadora, de proteção em papeis públicos.”

Ele destaca que a rentabilidade dos fundos vinha batendo as metas com folga até 2014, mas neste ano já se aproximaram, pelo ajuste do passivo e a rentabilidade menor. Mesmo assim, em termos internacionais, os fundos de pensão brasileiros estariam em boa situação, em quinto lugar em rentabilidade em um estudo feito pela Organização para o Crescimento e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Pena Neto destacou ainda que foram pagos R$ 36 bilhões em benefícios em 2016, sem casos de inadimplência.

Cresce uso de tábua atuarial mais atualizada

O setor também está mais sólido, pois está usando critérios mais rígidos para calcular quanto terão de pagar no futuro para seus pensionistas. Esse cálculo é feito usando-se a chamada tábua atuarial, que calcula os valores de acordo com a expectativa de vida das pessoas. No caso, a mais recente é a Tábua Atuarial 2000, com maior longevidade. Em 2006, apenas 15% dos fundos de benefício definido usavam essa tabela e esse percentual hoje é de 75%. Já nos planos de contribuição variável, que também implicam em compromissos dos valores a receber pelo beneficiário no futuro, o uso da TA 2000 passou de 9% para 79%. “A adoção da Tábua 2000 impacta os passivo significativamente”, explica Pena Neto. Somando as mudanças nas tábuas mais antigas, da CSO 58 para a AT 2000, foram de 25% de aumento nos passivos.

Solvência cai para 90%  com piora da rentabilidade

O presidente da Abrapp destaca, porém, a solvência, ou seja a capacidade que os fundos têm para pagar os compromissos de longo prazo, que segundo ele é um indicador mais importante que o comportamento dos rendimentos de curto prazo. O índice de solvência de um fundo compara o ativo dos fundos, ou seja, as aplicações e o dinheiro que ele tem, ao passivo futuro calculado a valores de hoje. O ideal é que esse índice fique em 100%, ou seja, os ativos cubram todo o passivo. No Brasil, os fundos tinham em 2014 107% de cobertura, abaixo apenas de países como Holanda, Noruega, Suécia, Alemanha e Finlândia, que são exemplos de previdência fechada.

Mas, como destaca Pena Neto, isso foi antes da piora no desempenho dos ativos. No final de 2015, Pena Neto estima que o índice de solvência tenha caído para 90%. “Mas ainda assim é um nível canadense”, diz, citando os dados do Canadá, que em em 2014 era de 93% e mesmo o dos EUA, que era de 71,9%. “Isso não quer dizer que haja um risco para os fundos americanos, mas é um retrato da situação naquele momento”, diz.

Diversificação pára

Para Pena Neto, a piora na rentabilidade não significa erros na condução da gestão dos fundos. “Houve um impacto muito forte da bolsa, que caiu muito, 30% em três anos, e nessa situação qualquer parcela de ações já teve impacto”, diz. Além disso, os investimentos feitos em ativos de maior risco se baseavam na expectativa de crescimento do país, que ainda não ocorreu. “Por exemplo, temos fundos de participação em empresas que devem performar ainda”, diz. Ele não espera, porém, que os fundos de pensão continuem diversificando significativamente suas carteiras. “O movimento de busca por risco reflete a necessidade dos fundos de obterem maior rentabilidade para cumprir as metas, foi o que aconteceu quando os juros caíram em 2010, mas hoje estamos num movimento contrário”, diz. “Em um ambiente de melhora da economia, o movimento de diversificação deve voltar.”

Expectativa para 2016 não é de melhora

A perspectiva para 2016 não é de melhora, afirma o presidente da Abrapp. “Qual a previsão para a economia brasileira, é de melhora? Acho que não, então nossa perspectiva é não aumentar o déficit das carteiras”, diz. Uma melhora da performance dos fundos de previdência fechados depende de uma melhora também da conjuntura econômica, com a volta o crescimento e a queda dos juros. “Mas não esperamos um 2016 muito diferente de 2015”.

Mudanças no investimento no exterior

Os investimentos no exterior também tendem a crescer, acredita Pena Neto, apesar de ainda ser pequeno, até pelas próprias opções domésticas nos juros. Outro entrave é a regulamentação brasileira, a instrução 3792, que exige que o fundo de pensão tenha no máximo 25% do fundo que aplica no exterior, o que exige pelo menos quatro fundos para o investimento fora e que não podem mudar suas participações. “Estamos negociando com a Previc (órgão que regula o setor) uma mudança, pois ao mesmo tempo em que controlamos demais o risco de concentração aqui, lá fora o fundo que recebe a aplicação pode concentrar quanto quiser”, diz. Ele espera que a Previc faça alguma alteração nessas regras ainda este ano.

Reforma da Previdência

“Estamos em uma conjuntura difícil, mas temos certeza de que os fundos de pensão terão resultado positivos se o país voltar a crescer, pois nosso déficit é conjuntural, não estrutural”, afirma Pena Neto. “Estamos em conversas constantes com o governo para estimular os fundos de pensão, não só como um instrumento de proteção do trabalhador como uma forma de propiciar também a formação de poupança de longo prazo para financiar o crescimento do país”, explica. “O governo fala em reforma da Previdência, e os fundos de pensão têm papel importante nesse processo”, diz.

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