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Abrapp: sem mudanças, fundos de pensão acabam em 2034

O sistema de fundos de previdência fechada, os fundos de pensão, está estagnado, sem gente nova entrando e o número de beneficiários crescendo, e precisa se reinventar, sob o risco de acabar até 2034, quando acabam os compromissos atuais, afirma Luis Ricardo Martins, recém-eleito presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp). Segundo ele, o sistema é sólido, tem mais de R$ 700 bilhões em reservas e paga R$ 34 bilhões em benefícios por ano para 700 mil aposentados e suas famílias. Mas, sem um plano que adapte o sistema aos novos tempos, que atraia mais empresas e jovens, a tendência é a previdência privada diminuir.

O novo presidente da Abrapp pretende focar seus esforços em quatro prioridades. Uma é o fomento, com um plano nacional que incentive a previdência privada. A segunda é a desburocratização , que torne mais simples os fundos, bem como seu registro e fiscalização. O terceiro ponto é a governança, que deve melhorar com o Código de Auto Regulação. E o quarto, a melhora na capacitação dos profissionais que atuam nos fundos por meio da criação de uma universidade especializada em previdência, a UniAbrapp.

Uma das suas primeiras medidas na parte de fomento será aprovar na próxima reunião do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), em março, uma norma que torne automática a inscrição dos funcionários de empresas que tenham fundos de pensão. O CNPC reúne representantes do governo, órgãos reguladores e dos fundos de pensão.

Hoje, a adesão aos planos de previdência nas empresas é voluntária, e muitos acabam adiando a inscrição e deixam de participar. Com a adesão automática, o processo se inverteria: quem não quiser participar avisará a empresa. “Hoje temos 500 mil funcionários de empresas com fundos que não participam, perdendo a oportunidade de fazer uma poupança com a ajuda da empresa, que paga uma parte”, lembra. Segundo ele, esses funcionários vão agradecer no futuro. “Daqui 20, 30 anos, terão uma poupança que talvez não teriam começado”, diz.

Segundo ele, alguns países, como o Reino Unido, já adotaram a adesão automática para fundos de pensão.

Fundos de associações e setoriais

Além da adesão automática, Martins aposta nos fundos de previdência fechada constituídos, de associações de classe, como o da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do qual ele é presidente. Esses fundos atendem categorias em que as empresas não oferecem planos ou na qual a maioria é de profissionais liberais. Os fundos constituídos e os setoriais, diz Martins, têm crescido, na contramão do restante do mercado. Ele dá o exemplo da própria OAB. “Chegamos a 600 adesões por mês no fim do ano passado e já temos 42 mil participantes”, diz.

Regimes próprios de Estados e municípios

Outra fonte de novos participantes deve vir do setor público, com os fundos dos funcionários públicos federais e dos regimes próprios de previdência social (RPPS) de Estados e municípios. Nesse caso, a crise de Estados e municípios pode ajudar o setor ao estimular os governos a criar fundos que assumam a responsabilidade da aposentadoria de seus servidores, como está ocorrendo em São Paulo.

Mais de 15 milhões de potenciais contribuintes

Martins estima que o número de potenciais investidores em previdência complementar privada no país chega a 15 milhões. Nesse número estão 1,6 milhão de servidores do RPPS, 1,1 milhão de servidores públicos, 6,6 potenciais clientes de fundos instituídos ou setoriais, 3 milhões de trabalhadores da população economicamente ativa que não contribui para a previdência complementar e mais os 500 mil das empresas que têm fundos, mas não aderiram. Há ainda 2,5 milhões que hoje já estão nos fundos da Abrapp. “Queremos pescar nessa aquário”, diz.

Chance perdida

Martins admite que a reforma da Previdência proposta pelo governo perdeu a chance de propor uma mudança mais estrutural do sistema previdenciário brasileiro, que interrompesse o modelo de pacto geracional, em que os jovens financiam os velhos aposentados pelo modelo de repartição simples. “Deveríamos sair desse modelo e partir para um de auto financiamento, ou capitalização”, afirma.

Mesmo assim, ele considera fundamental a chamada “reforma paramétrica”, que mudará algumas regras para resolver o problema fiscal do país. “É importante para o país criar a idade mínima, mudar a forma de correção dos benefícios, o tempo de contribuição”, afirma. Ao mesmo tempo, a discussão sobre a Previdência aumenta a preocupação da população em geral com o futuro, com a aposentadoria, o que beneficia os fundos de pensão e o explica o crescimento das adesões aos plano da OAB, diz Martins.

Reforma da Previdência no segundo semestre

Ele acredita que a reforma da Previdência deverá ser aprovada no segundo semestre deste ano, com algumas mudanças em relação à proposta original do governo. E diz que o projeto da Abrapp prevê um regime geral de previdência, como o INSS, juntamente com o sistema complementar. “No processo de repartição, está havendo um desequilíbrio pois o Brasil está virando um país de idosos”, explica. “Por isso propomos um sistema com um cobertor mais curto para todos e um sistema complementar”, diz.

Fundos em fase de desinvestimento

Dentro da agenda positiva defendida por Martins, além da adesão automática, está também o fortalecimento do CNPC como órgão regulador do setor de previdência. Para isso, diz o presidente da Abrapp, é preciso maior engajamento das associações para sensibilizar os principais atores do sistema de previdência, incluindo os representantes do governo e do mercado. “O sistema está em fase de desinvestimento, estamos pagando benefícios e se o cenário não mudar, até 2034, as reservas que temos estarão esgotadas depois de cumprirem sua missão”, alerta.

Impacto nas bolsas e no mercado de fundos

Isso terá impactos nos mercados de ações, na bolsa de valores e nos fundos de investimentos, que hoje administram parte desses recursos, observa Martins. “Temos tido reuniões com a BM&FBovespa e com a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) para mostrar esse problema”, diz. “ BM&FBovespa tem de enxergar que os recursos dos fundos vão se esgotar e o mercado vai sofrer as consequências desse desinvestimento, assim como os fundos”, diz.

Isenção total após 30 anos de aplicação

Outro problema é como tornar a previdência mais atrativa para investidores e empresas. Por isso, a Abrapp defende que haja uma isenção fiscal maior. “Propomos que as aplicações em previdência fiquem isentas após 30 anos, como forma de alongar os prazos e estimular o investimento em projetos de interesse do país, que vão ajudar o país a crescer”, diz Martins. Outra proposta é que as empresas que declararam pelo lucro presumido também possam abater as contribuições feitas para seus funcionários. “Hoje só há incentivo para as que declaram pelo lucro real, que são poucas”, diz.

Outra proposta da Abrapp é mudar a forma como é escolhido o regime de tributação da previdência, até 30 dias depois da inscrição. “Isso é pouco tempo, a pessoa não tem ideia de como será a vida dela daqui 20 anos”, diz.

Por isso, a Abrapp preparou um estudo analisando o impacto que essas isenções fiscais trariam para o governo. Segundo ele, o estudo, preparado por José Roberto Affonso, economista e professor da Escola de Direito de Brasília, do Instituto Brasiliense de Direito Público, mostra que o impacto na receita do governo das isenções para a arrecadação federal seria mínimo e o benefício em termos de mais investimentos de longo prazo seria enorme. “Vamos levar esse estudo para o governo nos próximos meses e mostrar que a queda de receita é mínima”, defende.

Escândalos dos fundos de pensão

Sobre os escândalos envolvendo o desvio de recursos de fundos de pensão por políticos e perdas provocadas por investimentos duvidosos, que obrigaram alguns fundos a elevar a contribuição dos associados para cobrir rombos, reduzindo o benefício dos aposentados em alguns casos, Martins afirma que são casos pontuais. “Houve um dano de imagem, mas são casos pontuais, e são também casos de polícia, que envolvem apuração, com direito de defesa dos envolvidos”, diz. Mas ele acrescenta que esses casos podem ser vistos também como oportunidades para o sistema evoluir.

“Em 1995, tivemos uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) sobre fundos que resultou na constitucionalização dos fundos de pensão”, lembra Martins. “Em 2005, foi a CPI dos Correios, que levou à criação da Previc (Secretaria de Previdência Complementar ).”, afirma Martins. “E agora temos um projeto de lei em discussão na Câmara que acolheu as sugestões da CPI dos Fundos de Pensão, de 2015, da qual participamos, e que vai colocar em discussão uma série de pontos importantes para o setor”, acrescenta. Ele não acredita, porém, que o projeto vai ser votado tão cedo. “Diante da agenda do governo com as reformas, talvez haja uma chance de votar no segundo semestre”, afirma.

Novas regras para investir em FIPs

O presidente da Abrapp observa que os problemas com fundos de participações, os FIPs, ou private equities, que aplicam em empresas fechadas e que deram prejuízos para os fundos de pensão, fizeram o setor deixar de aplicar nesse tipo de investimento, que é importante para o financiamento da atividade.

Para ele, se a queda dos juros esperada para este ano e para o próximo se confirmar, será preciso criar formas para os fundos de pensão voltarem a aplicar em FIPs e em projetos com segurança. “Se a queda dos juros se consolidar, os fundos terão de ser mais arrojados para conseguir bater suas metas e devem buscar projetos estruturais, buscar mais risco, por isso é preciso resolver essa questão dos FIPs”, explica. A Abrapp está conversando com os reguladores para criar formas que deem mais garantias para os investidores nesses fundos de participação, afirma Martins.

 

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