Arena Especial, Banco Central

Goldfajn: alta da inflação em maio e junho não muda trajetória de corte dos juros

A inflação medida pelo IPCA do IBGE deve voltar a subir em maio e junho por conta da revisão dos encargos relativos à usina nuclear de Angra III, que reduziram a conta de luz em abril em 0,3 ponto percentual. Mesmo assim, essa retomada não deve alterar a tendência de redução forte dos juros, afirma o presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn. Em discurso no encerramento do 19º Seminário de Metas de Inflação, no Rio, ele explicou que “oscilações grandes, pontuais e atípicas como essa não têm implicação relevante para a condução da política monetária”.

Nas últimas semanas, a tendência de queda da inflação se acentuou e fez o mercado aumentar as apostas em um corte mais forte dos juros básicos na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) dos dias 30 e 31 de maio. A expectativa de boa parte do mercado passou de 1 ponto percentual de corte, como na reunião anterior, para 1,25%, o que levaria a Selic de 11,25% ao ano hoje para 10% ao ano. Alguns bancos já trabalham com juros de 8% no fim deste ano.

Goldfajn disse também que perspectiva para a inflação deve evoluir de maneira favorável ao longo deste e dos próximos anos, de acordo com o cenário traçado pelo mercado para as taxas de juros e câmbio captado pela pesquisa Focus. “Para 2017, espera-se que a inflação acumulada em 12 meses permaneça abaixo da meta de 4,5% ao longo do ano, atingindo valor mínimo no terceiro trimestre do ano e elevando-se nos últimos meses para valores ainda abaixo da meta, mas onde parte dessa diferença (em relação à meta) é decorrência do impacto primário do choque favorável nos preços de alimentos”, afirma o presidente do BC. Nesse mesmo cenário, a trajetória de inflação deve atingir a meta de 4,5% em 2018, diz.

Ritmo do corte vai depender do ambiente

Por conta desse cenário, destaca o presidente do BC, a taxa básica de juros está num processo de queda. “Na última reunião do Copom, o cenário básico, os fatores de risco e o amplo conjunto de informações disponíveis levaram o Comitê a reduzir a taxa Selic para 11,25% a.a., através de uma queda de 1 ponto percentual”, lembrou. Mas observou que o ritmo de queda pode ser acelerado, afirmando que o comitê “considerou o atual ritmo adequado, entretanto, avaliou que a conjuntura recomendava monitorar a evolução dos determinantes do grau de antecipação do ciclo”.

A antecipação do ciclo nada mais é que cortar os juros mais rápido para chegar ao nível desejado. O grau de antecipação do ciclo desejado, ou seja, o tamanho do aumento dos cortes nos juros, depende da evolução da conjuntura econômica e das incertezas e dos fatores de risco que ainda pairam sobre a economia, afirmou Goldfajn.

Ele destacou ainda que, além dos juros nominais, as taxas de juros reais, descontada a inflação, também estão declinando no Brasil. “A taxa de juros real ex-ante (projetada), medida pela taxa prefixada em 12 meses (do mercado de swap DI) menos a inflação esperada para os próximos 12 meses, após atingir o auge de 9% em setembro de 2015, declinou para o nível de corrente de 4,5%”, lembrou.

Mudanças econômicas permitiram redução dos juros

Essa queda dos juros nominais e reais e da inflação são reflexo das mudanças na política econômica do governo de Michel Temer, “que mudou de direção e implementou várias reformas neste curto período”. Essas ações “já mostram resultados positivos”, afirma Goldfajn.

Segundo ele, diversas reformas e ajustes na economia brasileira aumentaram a confiança e reduziram a percepção de risco da economia brasileira. Ele citou o risco-Brasil, medido pelo CDS, que caiu de aproximadamente 500 pontos básicos, ou 5 pontos percentuais, no início de 2016, para abaixo da metade desse valor atualmente. “Isto evidencia maior confiança dos investidores externos na capacidade de solvência do país, fruto das reformas e do foco no combate à inflação e na recuperação da atividade econômica”, destacou.

Reforma fiscal e da Previdência

Além disso, disse, o andamento da reforma fiscal em curso (principalmente a aprovação da PEC dos gastos e o encaminhamento da reforma da Previdência) tem sido favorável e será decisivo para o bom desempenho futuro da economia brasileira, inclusive para a sustentabilidade da desinflação recente. “O trabalho do Banco Central, juntamente com o trabalho do governo na implementação de reformas econômicas necessárias, tem sido efetivo em conter a inflação e ancorar as expectativas”, afirmou.

“Nesse ambiente, podemos destacar que a inflação caiu de 10,7% em dezembro de 2015 para 4,1% em abril de 2017, e que as expectativas de inflação apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 4,0% para 2017, mantiveram-se ao redor de 4,4% para 2018 e, para 2019 e horizontes mais distantes, encontram-se em torno de 4,25%”.

Regime de metas

Goldfajn lembrou que participou do primeiro seminário sobre o regime de metas de inflação no Brasil, em 1999, quando ele foi criado, e que o sistema avançou muito de lá para cá, inclusive na utilização da política monetária, ou seja, dos juros, para controlar os preços.  “Houve desafios”, destacou. “No mundo, após a grande crise financeira internacional em 2008, o regime de metas para a inflação sofreu inúmeras críticas quanto à sua eficácia, tanto em países emergentes quanto em economias avançadas”, afirmou, numa referência ao esforço dos bancos centrais em reduzir os juros a quase zero para reativar as economias dos EUA e da Europa, e que mesmo assim não surtiu efeito. A política de juros teve então de ser reforçada por recompras de títulos para injetar liquidez na economia, as chamadas “políticas não convencionais”.

Hoje, mesmo após as lições trazidas pela crise, o regime de metas prevalece e tem se mostrado muito útil após a prolongada atuação de bancos centrais, “com respostas de políticas não convencionais em muitos países”, disse.

Goldfajn observou que, após um período longo de atuação dos bancos centrais, há sinais de recuperação da atividade econômica mundial. “já capturado no avanço de vários preços de ativos no mercado financeiro internacional”.

Metas no Brasil e políticas insustentáveis

Sobre o Brasil, Goldfajn criticou as políticas dos governos anteriores. “Recentemente, políticas insustentáveis (inclusive de represamento de preços administrados) e a desorganização das contas públicas levaram a inflação a permanecer por muitos anos em torno do limite superior da banda de tolerância da meta, para depois culminar numa inflação de quase 11% em 2015”, lembrou. Segundo ele, o desafio inicial da atual equipe foi conduzir a política monetária num ambiente de recessão econômica com inflação alta e persistente. “Nessas circunstâncias, a gestão do processo de desinflação é mais difícil”.

A partir de 2011, o Brasil viveu uma situação que se assemelha a um choque de oferta, explicou o presidente do BC. “O mesmo choque que nos levou à atual recessão desencadeou também a alta da inflação”, disse.

Numa situação como essa, com fundamentos macroeconômicos deteriorados, as expectativas de inflação permanecem altas, provocando comportamento defensivo dos agentes o que, por sua vez, alimenta a inflação corrente. “Nessa situação, apesar da recessão, a inflação permanece alta, como foi o caso no Brasil até recentemente”. Nesse contexto, se a política monetária não for capaz de ancorar as expectativas de inflação em torno do centro da meta, a inflação permanecerá alta e desancorada, explicou.

Críticas à tolerância do BC anterior

“Adiar posturas de políticas monetárias necessárias para a ancoragem das expectativas de inflação só elevaria os custos da desinflação no futuro”, acrescentou, numa crítica à gestão anterior, que se contentou em manter a inflação no teto do limite da meta, de 6,5% ao ano, e não nos 4,5% recomendáveis. “Por isso, a reconquista do controle das expectativas de inflação se tornou prioridade, particularmente após anos de inflação alta”, disse.

Segundo Goldfajn, a chamada ancoragem das expectativas, ou seja o controle das projeções do mercado, é precondição para alcançar uma inflação baixa e estável. “A ancoragem das expectativas precede qualquer processo de flexibilização monetária”, afirmou.

Nesses últimos meses, afirmou Goldfajn,  foi possível reduzir as expectativas por meio da mudança na direção da política econômica e da postura firme da política monetária. Com inflação ancorada na meta, de 4,5%, o Banco Central pôde intensificar o processo de flexibilização, contribuindo no esforço de recuperação da atividade econômica, concluiu.

 

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