Arena Especial, Câmbio

Ex-BC Carlos Thadeu vê pouco efeito na atuação do BC e Tesouro; Pastore espera dólar e juro em alta

A atuação do Banco Central (BC) e do Tesouro nos mercados de câmbio e títulos da dívida pouco impacto terá na tendência desses ativos. A avaliação é de Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do Banco Central e economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio. “As expectativas cambiais no Brasil envolvem riscos enormes e vai ser difícil o governo conseguir administrar juros e câmbio”, afirmou, durante seminário de comemoração dos 40 anos da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex).

Fed ficou atrás da curva

Para ele, a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos trouxe muita volatilidade para os mercados internacionais e mais ainda para o brasileiro. Para ele, agora o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) vai ter de correr e acelerar a alta dos juros diante do cenário de maior crescimento americano no curto prazo. “A eleição de Trump colocou o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) ‘ atrás da curva’ e ele vai ter de passar para a frente da curva, subindo mais os juros”, explicou.  “O Trump atropelou a comunicação do Fed com o mercado e ele vai ter de reagir”, diz. Para ele, o mundo está vivendo um processo de transição internacional que e pegou o Brasil de calças curtas, com uma política fiscal evoluindo a passos de cágado. “E a comunicação do BC brasileiro com o mercado também foi atropelada pelo Trump”, acrescenta.

Por isso, vai ser muito difícil arbitrar a taxa de câmbio brasileira no curto prazo, mesmo com as intervenções do BC. “Vemos o governo fazendo intervenções nos mercados de títulos e câmbio, mas acho difícil o Tesouro ter sucesso em comprar títulos prefixados para impedir a alta dos juros”, afirma Thadeu. “Já fizemos isso no passado e não deu certo”, diz. Ele lembra também que recomprar os papéis prefixados implica no pagamento de uma remuneração alta para o investidor, o que pode representar um risco moral para o governo. “Na verdade, só vamos conseguir definir as taxas de câmbio e juros quando o Fed definir sua estratégia”, afirma. “O dólar vai continuar subindo e os juros também e vão continuar assim até os juros dos EUA continuarem”, avalia Carlos Thadeu. Para ele, os juros americanos podem voltar para 2,5% ao ano para 10 anos. Hoje, esses juros estão em 2,3% ao ano.

Atuação não pode mudar tendência

Já o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore apoia as intervenções do BC e do Tesouro, lembrando que é função das autoridades reduzir a instabilidade dos mercados no curto prazo. Mas o governo não pode cair na tentação de tentar mudar a tendência desses mercados. “”Quando o BC atua para reduzir a volatilidade, o que fica é a tendência de longo prazo, ou seja, o BC não vai impedir com suas atuações que o dólar e os juros subam”, explica.

Segundo Pastore, o fato concreto é que mudou a perspectiva para a economia americana com Trump e os Estados Unidos vão atrair mais recursos, o que cria instabilidade nas demais economias. Isso sem contar com as promessas de mudanças no comércio americano.

Trump pode ajudar em algo

Pastore observa também que o crescimento americano no curto prazo atrapalha porque deve levar a um aumento dos juros pelo Fed, o que deve levar o Brasil a adiar a queda dos juros aqui. “Mas ao mesmo tempo, a atividade mundial mais forte pelos Estados Unidos ajuda as economias interligadas ao país”, afirma Pastore, citando o caso das commodities metálicas, que sobem desde a semana passada pela expectativa do investimento em infraestrutura nos EUA. “A ação da Vale disparou na semana passada por causa da alta do minério, então há fatores positivos também com Trump”, diz. “Se a alta fosse das commodities agrícolas, que tem peso na inflação do IPCA e nas metas do BC, aí seria ruim, mas nas metálicas ajuda”, explica.

Pastore lembra ainda que o Brasil não está condenado a não crescer mais. “Se o BC não consegue baixar mais os juros, a opção é aprofundar o ajuste fiscal, olhar os gastos, a Previdência, o seguro desemprego, a reforma trabalhista”, afirma.

Ele observa que o Brasil foi o país que mais sofreu com Trump entre os emergentes ao lado da África do Sul por serem países com problemas políticos e fiscais. “Para descolar desse quadro precisamos de uma política monetária mais expansionista (juros mais baixos) e fazer um ajuste fiscal mais profundo”.

Risco de protestos contra ajustes

Ele teme, porém, a reação da população às medidas de ajuste, lembrando que dois governadores do Rio foram presos. “E temos Estados que precisam fazer um ajuste fiscal duro que afeta os funcionários públicos que vão para a rua protestar”, diz. “Isso complica o processo, cria uma perturbação e, se comprometer a capacidade do governo de aprovar as reformas, a situação se tornará grave”, alerta.

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