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Dólar sobe 5% e bolsa cai 2%; mas a culpa não é só do Trump

Os mercados brasileiros tiveram hoje um dia ainda mais agitado do que ontem, quando a eleição do polêmico Donald Trump para a Presidência dos Estados Unidos surpreendeu o mundo. O dólar comercial disparou e subiu mais de 5%,recuando depois para R$ 3,371, ainda assim 4,98% acima do fechamento de ontem.

No mercado futuro, a moeda negociada para dezembro na BM&FBovespa bateu R$ 3,39, em alta de mais de 5%, o que fez a bolsa chamar um leilão para atender a forte demanda pela moeda, explica Bruno Foresti, gerente de câmbio do Banco Ourinvest. “O dólar não chegou a bater o limite de R$ 3,415, mas a bolsa fez o leilão mesmo assim, a R$ 3,38”, observa. Os juros futuros também subiram, especialmente os longos, com a taxa dos contratos de DI subindo, de 11,5% ao ano para 12,02% ao ano, ou 0,47 pontos percentuais. Um aumento muito forte para um mercado como esse em que cada ponto percentual representa milhões.

O nervosismo de hoje tem a ver com a eleição de Trump, avalia Foresti. “A expectativa é de que as políticas do novo presidente americano levem o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) a subir mais e mais rapidamente os juros, pelo corte de impostos, aumento de incentivos e pela política protecionista de tributação de importações, que elevarão a inflação. Por isso, os juros dos títulos americanos estão em alta, com o papel de 10 anos atingindo 2,07% ao ano.

Mas não é só isso. Foresti Ele observa que, apesar de outros mercados estarem agitados também, o Brasil está muito pior. “O real está perdendo mais que o peso mexicano, onde o dólar sobe 3%, o que não faz sentido se pensarmos que o maior prejudicado pelas promessas de Trump seria o México”, diz.

Além disso, o ouro, que é um termômetro da busca por proteção, está em queda hoje em Nova York, por conta do aumento dos juros americanos. O ouro futuro para dezembro cai 0,6%. “Se fosse só o Trump, o ouro estaria a US$ 1.330 a onça-troy, mas hoje ela está em baixa, a US$ 1.260 a onça”.

“Olhando esses pontos, não dá para dizer que se trata de um problema generalizado, mas sim um nervosismo acentuado por fatores pontuais do Brasil”, afirma. “É preciso olhar para dentro de casa para encontrar os fatores que estão puxando o dólar”, diz.

Sobre fatores internos, Foresti lembra da notícia publicada hoje pela Folha de S.Paulo de que o relator do processo que analisa a cassação da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer deve dar um parecer a fator da punição, o que poderia levar à saída do atual presidente. Além disso, uma notícia do jornal “O Estado de S.Paulo” fala de um cheque de R$ 1 milhão da construtora Andrade Gutierres para a campanha de Temer de 2014, o que poderia complicar ainda mais a situação do presidente. “O mercado estava subindo, mas essas notícias acentuaram a alta do dólar”, afirma Foresti.

Ele diz que há uma busca por proteção no mercado, que agitou até o pacato mercado de ouro da BM&FBovespa. Foram negociados cerca de 35 quilos do metal, para uma média diária de menos de 10 quilos. “É um volume financeiro pequeno, coisa de R$ 4 milhões, mas mostra que há investidores procurando diversificar um pouco a carteira”, diz.

Para Foresti, para os investidores, o momento é de observar, não tomar decisões precipitadas, pois os mercados estão muito instáveis. Entre a mínima e a máxima do dólar para dezembro hoje, a moeda oscilou R$ 0,18, ou cerca de 5%, o que é quase o equivalente aos juros de seis meses. “É hora do investidor analisar com calma e aguardar, temos da PEC dos gastos públicos, as denúncias da Lava Jato, o julgamento da chapa do presidente e os próximos dias de Trump como presidente eleito, é preciso ver o que ele tem a dizer”, observa, lembrando que ontem mesmo o candidato republicano já amenizou o discurso e pediu união nacional. “É um momento de cautela, um pouco mais que o normal”, diz.

Trump culpado

Já Tarcísio Rodrigues, diretor de cambio do Banco Paulista, acha que a movimentação de hoje é reflexo do efeito Trump. “O mercado não imaginava que ele ganharia e agora está se protegendo”, diz. Além disso, o Banco Central brasileiro anunciou que vai suspender os leilões de swap cambial reverso, mostrando preocupação com a alta do dólar. E o ministro Henrique Meirelles falou hoje que a tendência é de diminuição do fluxo de capitais para emergentes. “Acho que o viés maior para a alta do dólar está no Trump”, diz.

Para ele, o real ainda tende a se desvalorização mais, assim como as moedas de outros países emergentes, que estão perdendo valor. Há uma inquietação no mercado mundial em torno das medidas protecionistas que Trump vai tomar. E os maiores investidores mundiais são americanos. “Por isso os mercados mundiais vão continuar muito voláteis até ele assumir e começar a fazer as coisas, como quando o Lula venceu aqui e o dólar foi a R$ 4,00 e depois voltou”, lembra. Ele acha que o melhor para quem tem de viajar e não comprou ainda a moeda é adquirir logo os dólares, “pois o efeito pode ser mais amargo mas para frente”, diz.

 

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